29/10/2008

A Fortaleza de Peniche, a Pousada e o futuro

A fortaleza de Peniche encontra-se hoje numa encruzilhada da sua já longa existência (construção cerca de 1570), vou por isso traçar aqui uma resumida cronologia da sua existência recorrendo à DGEMN (Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais) a bibliografia de outros autores (nomeadamente e principalmente do Dr. Mariano Calado) e a alguns apontamentos e memórias minhas, os factos marcantes da sua história, enfim as diversas facetas porque já passou, para assim enquadrar o assunto que aqui vou expor.




Cronologia:

1570 - Início das primeiras construções de defesa da península, a pedido de D. Afonso de Ataíde, conde de Atouguia, interrompidas c. de 1577, com a partida para o Oriente de D. Luís de Ataíde; (o baluarte do Redondo, dentro da fortaleza faz parte das construções então erigidas, segundo inscrição aí existente, além de obras pontuais de defesa do istmo).

1598 - Filipe Terzi desloca-se a Peniche para dirigir a construção da fortaleza, que não terá chegado a efectivar-se (Mariano Calado, 1991: p. 114).

c. 1645 - Conclusão da obra de remodelação da fortaleza, em planta estrelada, durante o governo de D. Jerónimo de Ataíde, segundo inscrição existente no portal principal.

c. 1650 - Início da construção da linha de muralhas, seguindo o istmo, defendida por fosso em todo o seu comprimento, a partir de braço de mar aí existente, segundo planta de Langres, que previa a construção de comportas junto aos baluartes da Misericórdia e Camboa (Ibidem, pp. 118/119).

c. 1665 - A construção dessa linha de muralhas ter-se-á iniciado mais tarde, ficando-se a dever a Simão Mateus e Mateus do Couto (Moreira, 1986: p. 79).

1686 - Manuel do Couto substitui Mateus do Couto (Gonçalves, 1983: p.256); o Forte de Nossa Senhora da Vitória, no Cabo Carvoeiro, terá sido construído por esta altura (Callixto, 1980).

1671 - Melhoramentos no Forte de Cabanas, segundo inscrição deslocada para o baluarte Redondo, na fortaleza (Ibidem, p. 154);

séc. XVIII, 1ª metade - conclusão de baluartes na linha de fortificação do istmo (Ibidem, p. 160).

1755 - O terramoto destrói parte da cortina defensiva do lado N.; reforço da mesma com vigotas de ferro e estacada (Ibidem, p. 162 e 183).

1759 - As armas do Conde de Atouguia existentes na fortaleza são picadas por ordem do Marquês de Pombal, por acusação de implicação no atentado de D. José.

1807 – Invasões francesas, a 8 de Dezembro o general Thomiéres entra triunfal em Peniche e ocupa a fortaleza (Ibidem. 170).

1808 - Construção das baterias para fogo de fuzil, por ordem de Junot, no Carreiro do Cabo e no Porto da Areia do Sul.

1808 – Meados de Setembro, a bandeira lusitana tremula ao vento no cimo das velhas muralhas da cidadela, Junot capitulara (ibidem, p. 173).

1810 - O marechal Beresford manda fazer obras na cidadela e em troços da muralha; construção de uma contra escarpa entre os baluartes da Ponte e da Misericórdia, para impedir o assoreamento do fosso.

1815 - Reparação de rombos na muralha da Camboa.

1820 – Inicio da guerra fratricida – participação activa da fortaleza de Peniche quer como praça de armas quer como prisão, quer pelo movimento liberal (até 1826) quer pelo chamado movimento absolutista (a partir de 1828).

1830 - Construção da fortificação no Portinho da Areia de Cima e ampliação do Forte das Cabanas.

1832 - Construção do entrincheiramento de São Miguel, entre o baluarte da Gamboa e as arribas do Porto da Areia do Norte.

1837 - Uma explosão no paiol da fortaleza destrói o palácio do governador.

1862 - Construção de contra escarpa, substituindo a levantada pelos ingleses, planeada pelo Cap. de Eng.ª Guedes de Quinhones e de igual defesa para o Portinho do Meio (Ibidem, p. 389).

1901 – A África do Sul fervera numa luta entre ingleses e «bóeres», vendo-se estes vencidos, obrigados a refugiar-se em território de Moçambique, onde lhes foi concedido asilo. Aos poucos o transporte de centenas de refugiados começa a ser feito para a metrópole e em Peniche estavam preparados para receber um oficial, um médico, dois clarins, dois enfermeiros e 275 praças; mas segundo um relatório de 13 de Março, poderiam ser alojados na Fortaleza três oficiais e 260 a 420 praças. Decorridos três anos e apaziguados os ânimos regressou a maioria dos refugiados à África do Sul ficando outros para sempre na terra que os recolheu. (Ibidem, p. 203).

1934 – A fortaleza transforma-se por acção do estado novo e devido à forte repressão política que se abate no país em prisão política de alta segurança, é seguramente um dos períodos mais negros da sua existência.

1960 – Fuga espectacular de Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP e mais 9 companheiros.

1974 – Libertação do país pelo movimento das forças armadas, ocupação militar da fortaleza e libertação dos presos políticos no dia 27 de Abril. Passa a acolher alguns presos mais importantes da PIDE e do antigo governo como Silva Cunha.

c. 1976 – Devido ao regresso de milhares de portugueses oriundos das ex-colónias aquando da descolonização algumas dezenas têm recolhimento na Fortaleza até à década de 80.

1984 – Um dos três pavilhões passa a ser usado como Museu Municipal, contemplando material arqueológico, etnográfico, histórico e ainda o núcleo da resistência.

2008 – Interesse do grupo Pestana em possuir uma Pousada nas instalações da Fortaleza.

ÉPOCA: séc. XVI – XX

Arquitecto/Construtor/Autor : Engº. militar Nicolau de Langres (1650) - linha de muralhas de defesa do istmo (Calado); Simão Mateus e Mateus do Couto (C. 1665) (Moreira); Mateus do Couto e Manuel do Couto, este a partir de 1686 (Gonçalves).

Fonte: Inventário da DGEMN - Angelo Silveira 1997.
Bibliografia: PEREIRA, Esteves, RODRIGUES, Guilherme, Portugal Diccionário, vol. V, Lisboa, 1911; LARCHER, Jorge das Neves, Castelos de Portugal, Lisboa, 1933; ALMEIDA, João de, Roteiro dos Monumentos Militares Portugueses, Lisboa, 1946; SEQUEIRA, Gustavo de Matos, Inventário Artístico de Portugal, vol. V, Lisboa, 1955; Tesouros Artísticos de Portugal, Lisboa, 1976; CALLIXTO, Carlos, A Igreja, o Forte e o Farol do Cabo Carvoeiro, in Revista da Marinha, 86, Fev. 1980; GONÇALVES, Flávio, As obras setecentistas da Igreja de NªSª da Ajuda de Peniche e o seu enquadramento na Arte Portuguesa da 1ª metade do séc. XVIII, in Boletim Cultural da Assembleia Distrital de Lisboa, 88, 89, 1982, 1983; MOREIRA, Rafael, Do rigor teórico à urgência prática: a arquitectura militar, in História da Arte, vol. 8, Lisboa, 1986; BLOT, J.Y., A cidadela do mar, Peniche, 1989; CALADO, Mariano, Peniche na História e na Lenda, Peniche, 4ª edição, 1991.
www.oestediario.com



O Futuro

Verificamos assim que a Fortaleza tem a ver com todo o sistema de defesa da península de Peniche e também dada a sua posição estratégica no âmbito de defesa do reino à época.
Quer dizer que a sua importância não pode ser só vista à luz da prisão política ou de monumento, mas tem que ser realçada a sua importância como praça de armas muito importante, prisão política em diversas épocas e ainda como centro de acolhimento também em diversas épocas.
Ou seja, toda a discussão que possa ser feita em relação ao futuro deste grandioso monumento tem de passar na minha opinião pela salvaguarda da identidade dos diversos serviços e enquadramentos históricos que a mesma teve.
Não faz então sentido centrar a discussão em torno da fortaleza ser:
Só museu de resistência;
Só pousada;
Pousada com museu da resistência;
Pousada com museu de resistência e museu municipal;

Penso que há uma hipótese que deve ser discutida na minha singela opinião, que é o monumento contemplar a nova pousada, uma zona reservada à identificação da praça de armas com todo o simbolismo histórico que isso tem e que seria também uma mais valia de interesse turístico, dada a importância que teve na história militar portuguesa nos séculos XVI a XIX, o museu de resistência em espaço condigno e suficiente e ainda um museu municipal mais moderno que o actual e mais interactivo que aborde todas as temáticas do concelho e são muitas, desde a construção naval à industria da pesca e conserveira, à arqueologia, à etnografia, etc e aqui confesso, é que ponho algumas dúvidas se o mesmo seria de ficar na fortaleza ou seria de criar um novo de raiz ao abrigo desta execução aproveitando “o balanço”, de facto um museu moderno e virado para o futuro pode não ser compatível com as condições apresentadas por um pavilhão da fortaleza, no entanto penso que o mesmo arquitecto que vai fazer o projecto da Pousada poderia apresentar um projecto para um museu destas características.

Enfim toda a discussão é possível e necessária, direi mesmo urgente. Tenho visto comunicados de diversas organizações, de partidos, entrevistas, posts em Blogs, noticias, a maioria de origem fora de Peniche e ainda não vi a discussão que deve ser feita pelos naturais de Peniche acerca do que se pretende para o nosso monumento.

Os naturais de Peniche nunca desejaram que a sua fortaleza se transformasse numa prisão política, era uma vergonha, mas agora em tempo de democracia, deixem-nos ao menos ter voto na matéria.

Estou a dar o meu contributo e acho que todos deveríamos dar a sua ideia, é assim que eu entendo a democracia, agora é que todos devemos dar uma opinião, não é depois da obra estar feita que nos vamos pôr a dizer mal.

2 comentários:

Anónimo disse...

Estava a espera que alguem comentasse primeiro, porque e realmente muito importante para quem vive e que esta atento a tudo que se passa na nossa terra...
Penso que tal como tu dizes Chico sao os penicheiros que terao de ter a primeira palavra nesta materia..nao esquecendo o passado tera que haver espaco para que ele nao se apague defenitivamente.
A Pousada e o seu futuro tera que passar por ai..creio que a espaco para tudo..tem-se feito em todo o pais concerteza tambem na Fortaleza de Peniche nao devera ser escepcao..
Obrigado Chico da maneira como tu apresentas este topico que vai dar ainda muito que falar..
A cronologia historica fazendo referencia dos 'BOERS' e muito interessante.
Este foi a minha honesta contribuicao
Abraco

Anónimo disse...

Mais uma vez,obrigado.Hoje aprendi ,com a tua ajuda,coisas muito importantes sobre a nossa terra.Algumas (poucas),já eram do meu conhecimento,mas todo este trabalho de pesquisa que aqui nos mostras,é sem dúvida ,o trabalho de quem tem Peniche no coração,de quem vibra e respira todas as emoções,que nós só poderemos sentir mais próximo pelo teu amor e pela tua dedicação a uma terra que é o orgulho de todos os seus filhos
Bem hajas Francisco Germano,por seres o homem que és e por seres o Penhicheiro que todos gostariamos de ser ,pelo amor á nossa terra.
Um abraço